AMOREMA (Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá) e AMORETGRAP  (Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Terra Grande-Pracuúba) vs. Sustainable Carbon e outros (Créditos de carbono e Reservas Extrativistas)

Divulgue esta ação

Resumo

Elaborado pela equipe do JusClima2030 em 28 de October de 2023

Petição Inicial

A Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá (AMOREMA), e a Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Terra Grande – Pracuúba ingressaram com ação civil pública em desfavor de:

SUSTAINABLE CARBON – PROJETOS AMBIENTAIS LTDA., ECOMAPUÁ CONSERVAÇÃO LTDA., ECCAPLAN CONSULTORIA EM SUSTENTABILIDADE, BIO ASSETS ATIVOS AMBIENTAIS LTDA., DELOITTE TOUCHE TOHMATSU CONSULTORES LTDA., BARILLA G. E R. F.LLI S.P.A., BANCO SANTANDER S.A, (h) ISA CTEEP – COMPANHIA DE TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA PAULISTA (REQUERIDA ISA CTEEP), DELOITTE TOUCHE TOHMATSU AUDITORES INDEPENDENTES (REQUERIDA DELOITTE II), BB MAPFRE PARTICIPAÇÕES S.A. (REQUERIDA MAPFRE), IATA INTERNATIONAL AIR TRANSPORT ASSOCIATION, SWIRE PACIFIC OFFSHORE OPERATIONS (PTE.) LTDA., INTER-AMERICAN DEVELOPMENT BANK (BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO – REQUERIDA INTER-AMERICAN), COMPANHIA DE LOCAÇÃO DAS AMÉRICAS (REQUERIDA LOCAÇÃO DAS AMÉRICAS), GROUPE AIR FRANCE (SOCIETE AIR FRANCE – REQUERIDA AIR FRANCE), 17ER OBERLANDENERGIE GMBH (REQUERIDA 17ER), WIENERBERGER GMBH (REQUERIDA WIENERBERGER), BROCKHAUS STAHL GMBH (REQUERIDA BROCKHAUS), e demais empresas adquirentes dos créditos de carbono do Projeto Ecomapuá que não puderam ser identificadas com qualificação.

Como narrativa fática, alegam as autoras que as empresas indicadas como Rés na ação civil pública comercializaram, sem autorização, créditos de carbono provenientes do interior ou do entorno das Reservas Extrativistas Mapuá (RESEX Mapuá) e Terra Grande-Pracuúba (RESEX Terra Grande-Pracuúba), áreas de domínio público cujo direito real de uso é concedido à população extrativista tradicional que nelas habita. Aclaram o conceito geral de RESEX; especificam sobre as RESEX Mapuá e Terra Grande-Pracuúba; bem como pormenorizaram o funcionamento do mercado de créditos de carbono e sua exploração a partir das áreas do interior e entorno das RESEX Mapuá e Terra Grande-Pracuúba.

Referem as autoras ocorrer uma espécie de “grilagem” dos créditos de carbono oriundos do interior ou entorno da RESEX, argumentando que as empresas indicadas se apropriariam de modo indevido dos referidos créditos, obtendo vantagem econômica a partir da preservação ambiental promovida pela população extrativista tradicional que ali reside. A população local, segundo reportam as autoras, não receberia justa remuneração ou indenização pelo trabalho realizado ou pelo uso de imagem.

Sustentam a legitimidade ativa das autoras para a propositura da ação, bem como a gratuidade da justiça. Quanto à legitimidade passiva, aponta as empresas responsáveis pela comercialização dos créditos de carbono e as empresas adquirentes dos referidos créditos de carbono. Postula, no tópico, a citação por edital das empresas adquirentes, de modo a não prejudicar a tramitação do feito.

No que respeita à fundamentação jurídica de mérito, as autoras argumentam que as Requeridas incorreram em ato ilícito (artigo 186 do CC), porquanto causaram danos materiais e morais à população extrativista tradicional que reside nas RESEX Mapuá e Terra Grande-Pracuúba, bem como no seu entorno, devendo repará-los como prevê o artigo 927 do CC.  Quanto à conduta das requeridas que comercializaram os créditos, refere-se que a população local não teria autorizado a comercialização dos créditos de carbono e tampouco recebido a contrapartida pecuniária. Ponderam, por conseguinte, que os negócios jurídicos celebrados que envolveram a transferência dos créditos de carbono são nulos, por violarem o disposto no art. 104, II, CC, e que o direito brasileiro não admite negócio jurídico cujo objeto compõe patrimônio de terceiro, sem que haja expressa autorização deste.

A legislação brasileira, segundo as autoras, reconhece às populações extrativistas direitos territoriais relativos à área que ocupam, e que tal reconhecimento integra o próprio conceito de povos e comunidades tradicionais, previsto no art. 3º, I, Decreto nº 6.040/2007.

Quanto à conduta das empresas adquirentes dos créditos de carbono, ponderam as autoras que, além de terem participado de negócio jurídico com objeto ilícito (art. 104, CC), as adquirentes não tiveram a diligência necessária ao realizar a compra. Essa falha, caracterizada como negligência (art. 186 do CC).

Postulam pela restituição in natura dos créditos, o ressarcimento pelos danos materiais experimentados e, caso não reconhecido tal prejuízo, o acolhimento do direito de restituição dos lucros auferidos pelas requeridas às custas da comunidade local, em razão de enriquecimento sem causa (artigo 884 do CC), e a condenação em danos morais sofridos pela comunidade extrativista local.

Foram formulados os seguintes pedidos:

(a) A citação das REQUERIDAS para participação em audiência de conciliação e eventual apresentação de contestação, observadas as seguintes condições: (a1) Em relação REQUERIDAS que foram identificadas na qualificação das partes, a sua citação pessoal; (a2) Em relação às REQUERIDAS que foram identificadas, mas cuja qualificação não é conhecida, a expedição de ofício às autoridades competentes para a obtenção das informações necessárias à citação; (a3) Em relação às REQUERIDAS desconhecidas, que não foram identificadas na qualificação das partes, a sua citação por edital;

(b) Para a instrução da demanda, a determinação para que, no prazo de até 15 dias (art. 8º, Lei nº 7.347/85): (b1) As REQUERIDAS VENDEDORAS apresentem relatórios detalhados contendo as seguintes informações: (i) número total de créditos de carbono certificados para o Projeto Ecomapuá; (ii) número de créditos de carbono vendidos; (iii) nome e qualificação de todas as empresas adquirentes dos créditos; (iv) data das respectivas compras; (v) quantidade de créditos comprados por cada empresa adquirente; (vi) preço do crédito de carbono relativo a cada umas das transações efetivadas; (b2) As REQUERIDAS apresentem os contratos, comprovantes, certificados e demais documentos necessários ou convenientes para a análise das transações realizadas no âmbito do Projeto Ecomapuá, bem como do respectivo preço; (b3) A realização da tradução juramentada dos documentos em língua estrangeira que instruem a inicial;

(c) A concessão dos benefícios previstos no art. 18, Lei nº 7.347/1985, bem como dos benefícios da justiça gratuita em favor das REQUERENTES (art. 98, CPC) – inclusive no que diz respeito à “remuneração do […] tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira” (art. 98, § 1º, VI, CPC);

(d) A citação do Ministério Público Federal, para que se manifeste sobre a presente ação;

(e) A procedência da ação, com a consequente condenação solidária das REQUERIDAS a pagar às REQUERENTES, para utilização em benefício da população extrativista tradicional: (e1) Indenização por danos materiais, cuja quantificação dependerá de instrução probatória e poderá ser definida em fase de liquidação; (e2) Restituição dos benefícios auferidos pelas REQUERIDAS às custas das REQUERENTES e de seus representantes, por meio da venda dos créditos de carbono ou de sua aquisição por valor abaixo do preço de mercado – restituição essa cuja quantificação também dependerá de instrução probatória e poderá ser definida em fase de liquidação; (e3) Indenização por dano moral coletivo, cuja quantificação dependerá de instrução probatória;

(f) A procedência da ação, com a consequente determinação para que, sob pena de imposição de multa, as REQUERIDAS parem de: (f1) Comprar ou vender créditos de carbono oriundos do interior ou do entorno das RESEX Mapuá e Terra Grande-Pracuúba; (f2) Utilizar o nome e a imagem das populações extrativistas tradicionais, da AMOREMA, da AMORETGRAP e das RESEX Mapuá e Terra Grande-Pracuúba;

(g) A condenação das REQUERIDAS ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, a serem fixados no percentual máximo admitido pelo CPC;

(h) A produção de todas as provas admitidas em direito.

Decisão declinatória de competência na Justiça Federal

Em 04 de julho de 2022 foi proferida pelo Juízo Federal de Belém/PA decisão declinando a competência para apreciação do feito à Comarca de Breves da Justiça Estadual. Considerou o juízo federal a ausência, entre as partes envolvidas na ação, de entes que justificassem a competência da Justiça Federal, nos moldes do artigo 109 da Constituição Federal de 1988.

Decisão declinatória de competência na Justiça Estadual Em 21 de novembro de 2022 foi proferida, pelo Juízo da Comarca de Breves, decisão suscitando conflito negativo de competência perante o Superior Tribunal de Justiça – nos termos da combinação do art. 64, § 1º com o art. 951, ambos do Código de Processo Civil. Considerou o juízo estadual a presença do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) entre os demandados, organização financeira internacional, circunstância que justificaria o processo e julgamento da ação perante a Justiça Federal.

Documentos disponíveis

Documentos analisados pela equipe do JusClima2030 para a catalogação do litígio.

Casos similares

Compilação, pela equipe do JusClima2030, de litigíos climáticos em outras jurisdições que apresentam discussões semelhantes.
Nenhum caso similar associado