Laboratório do Observatório do Clima vs IBAMA e Outros

Divulgue esta ação

Resumo

Elaborado pela equipe do JusClima2030 em 21 de October de 2024

Petição Inicial 

Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Laboratório do Observatório do Clima em face do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, na qual se discute nulidade e pretende anular Licença Prévia n°672/2022, relativa à reconstrução e asfaltamento do “trecho do meio” (ou “trecho 3” ou “segmento C”) da BR-319 (do km 250,7 ao km 656,4); com pedido de tutela de urgência liminar para suspender a eficácia da referida licença prévia, até decisão final de mérito.

A inicial narrou que a rodovia BR-319 foi construída na década de 70 e permaneceu sem manutenção entre as décadas de 80 e 90, o que culminou na ausência de trafegabilidade. Acrescentou que, em 2005, o governo federal decidiu recuperar o pavimento da rodovia BR-319, consoante processo administrativo n°2001.006860/2005-95.

Pouco tempo depois, teriam sido feitas denúncias ao Ministério Público Federal, informando o avanço das obras de pavimentação na região, sem licença ambiental. Em consequência, foi instaurado inquérito civil e assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o MPF, o IBAMA e o DNIT, para submissão e adequação do licenciamento ambiental da rodovia BR-319, como condição ao prosseguimento das obras.

Refere a inicial que quando da análise do primeiro EIA/RIMA apresentado pelo DNIT, o IBAMA teria reconhecido a relação entre aumento de áreas de desmatamento e a pavimentação da rodovia. No mesmo parecer, teria concluído que o “empreendimento só seria viável em um cenário de governança ambiental forte, que, no entanto, ainda deveria ser construído e implementado para a área de influência da rodovia, o que demandaria grande esforço governamental, com a participação de vários órgãos públicos”. Em seguida, a autarquia orientou a adoção de medidas adicionais para garantir a devida governança na região e a viabilidade ambiental do projeto.

Segundo o autor, ao longo do processo administrativo de licenciamento ambiental, o IBAMA teria apresentado pareceres e vistorias com alertas para a explosão do desmatamento da região em caso de pavimentação da rodovia, deixando claro o risco concreto de ocupação predatória de seu entorno. Segundo a inicial, ainda assim e a despeito destas constatações, o IBAMA teria emitido a Licença Prévia n°672/2022 em 28/07/2022, atestando a viabilidade ambienta do empreendimento, em violação às normas de Direito Ambiental e Constitucional e contradizendo as suas próprias conclusões técnicas. Postulou, em sede liminar, a suspensão da licença da rodovia BR-319.

Para impugnar a validade e legalidade da licença prévia, os autores destacaram, em síntese: 

a) que a concessão da licença prévia contraria as orientações do Grupo de Trabalho e Comitê Interministerial, quanto à necessidade de adoção e implementação de medidas de governança ambiental e territorial, para fins de viabilidade ambiental do empreendimento; 

b) que a licença prévia foi emitida a despeito da insuficiência de governança ambiental mínima para fazer frente à complexidade e graves consequências ambientais decorrentes do empreendimento, em especial o aumento do desmatamento na região; 

c) que a licença prévia foi concedida sem que fosse apresentado o necessário estudo do impacto climático decorrente da pavimentação da rodovia; e

 d) que a licença prévia teria sido emitida sem a obrigatória consulta prévia aos povos indígenas e comunidades tradicionais que serão impactadas pela obra da BR-319.

Em definitivo, a ação postula pelo julgamento de procedência da demanda para confirmar a tutela antecipada e anular a Licença Prévia no 672/2022, assim como quaisquer atos administrativos dela decorrentes.

Decisão liminar

Em 24 de julho de 2024 foi proferida decisão liminar os autos. 

O pedido de tutela de urgência foi DEFERIDO, para determinar a SUSPENSÃO imediata dos efeitos da Licença Prévia n°672/2022, emitida pelo IBAMA ao DNIT.

Ao deferir o pleito liminar, a Magistrada consignou:

“É preciso que políticas públicas de infraestrutura, energia e transporte não esvaziem os esforços de adequação do Plano Nacional de Mudança Climática e atualização das contribuições nacionalmente determinadas pelo Brasil, para mitigação e adaptação das mudanças climáticas; reforçando o dever de avaliação, prevenção e controle de causas conhecidas de emissões ilegítimas de gases do efeito estufa (art. 4°, inciso I da Lei n°12.187/2010).

Ainda, este dever de integração e compatibilização entre políticas públicas, também está retratada na novel legislação que estabelece diretrizes para Planos de Adaptação Climática (Lei n°14.904 de 27 de junho de 2024), em seus artigos 2°, inciso II e IV; bem como art. 3°, incisos II e III.

Se diagnósticos de emissão de GEE sequer compõe os estudos de impactos ambientais de grandes obras e empreendimentos, torna-se letra morta o dever de integração das estratégias de mitigação e adaptação à mudança do clima nos âmbitos local, regional e nacional (art. 5°, inciso IV da Lei n°12.187/2010).

Estes dispositivos todos constituem fontes normativas primárias para sustentar o dever de elaboração de estudos de impacto climáticos, que incluam prognóstico para emissões de gases de efeito estufa, que tenham como causas antrópicas os impactos e danos já identificados para empreendimentos de grande porte, como é o caso de significativo desmatamento nas áreas de entorno da BR-319.

A ausência de estudos de impacto climáticos para o empreendimento implica subdimensionamento do EIA-RIMA, comprometendo tanto o controle governamental, como também o controle público dos efeitos e impactos atrelados à BR-319. Em última análise, o subdimensionamento dos impactos ambientais de grandes empreendimentos tende a esvaziar compromissos nacionais assumidos para mitigar a crise climática.

Quanto aos direitos fundamentais indígenas, também não está claro que tenham sido realizadas consultas prévias, livres e informadas aos povos indígenas e comunidades tradicionais afetados pelo empreendimento. Além dos parcos documentos apresentados pelas partes nos autos, ofícios e anuências da FUNAI não podem ser interpretados como cumprimento do dever de consulta prévia.

Os povos indígenas são povos culturalmente diferenciados que possuem seus próprios costumes, línguas e tradições, sendo-lhes reconhecido o direito fundamental à autodeterminação. Para fins de concretizar o direito à autodeterminação de povos indígenas, é preciso que estes tenham seus territórios respeitados e que sejam ouvidos e considerados sempre que algum empreendimento ou medida legislativa puder afetá-los. Aliás, o meio ambiente saudável e equilibrado é pressuposto para que povos indígenas possam fruir do direito à vida digna, segundo seus costumes e modos, nos exatos termos do art. 231, caput e §1° da CRFB.

Decisão em Agravo pelo TRF1

Em 23 de agosto de 2024 foi proferida decisão pelo E. TRF1 em sede de agravo em face da decisão liminar. O Relator, Presidente do TRF1, INDEFERIU o pedido de suspensão da decisão liminar, entendendo ausentes os pressupostos para a suspensão pretendida.

Documentos disponíveis

Documentos analisados pela equipe do JusClima2030 para a catalogação do litígio.

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