Resumo
Elaborado pela equipe do JusClima2030 em 21 de February de 2024Petição Inicial
O Partido Rede Sustentabilidade ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido cautelar, objetivando a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 1º, na parte que altera o parágrafo único do art. 31 e §6º do art. 85-A da Lei Estadual nº 18.102/13; Art. 2º, na parte que altera o §2º do art. 3º, §5º do art. 26, §6º do art. 27, §2º do art. 30º, p. único e art. 50-A da Lei Estadual nº 18.104/13; Art. 3º, na parte que altera o art. 3º, XIII e XV, art. 8º, III e §3º do art. 11, §§ 3º e 4º do art. 32, §5º do art. 50 da Lei Estadual nº 20.694/19 e art. 5º e da Lei 22.017/23 e §3º e §4º do art. 30 da Lei nº 18.104/13, que foram inseridos pela Lei Estadual nº 20.961/21.
Em suas razões, a inicial refere que a Lei que as alterações questionadas alteram quatro Leis ambientais importantes do Estado de Goiás, repletas de questões técnicas complexas, que tratam sobre a proteção legal de um dos biomas mais importantes do país. Referem que o projeto para alteração tramitou em cerca de 30 dias, sem qualquer debate, sem qualquer participação da sociedade civil, sem, inclusive, passar pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa. Argumenta que a Lei Estadual n. º 18.104/2013 (Código Florestal de Goiás), que foi uma das normas alteradas, prevê em seu art. 83 o Fórum Permanente do Meio Ambiente, que tem como objetivo discutir propostas de atualização e revisão do próprio Código Florestal, sendo ignorado seu cumprimento. Pontuou sobre a legitimidade ativa do requerente, e sobre a legitimidade das instituições arroladas (Associação para a Recuperação e Conservação do Ambiente – ARCA, Rede Cerrado, Instituto Plantadores de Água, Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN, Alternativa Terrazul) para figurarem como amicus curiae na ação.
A parte requerente reporta a importância ambiental, climática, social, cultural e econômica do bioma do Cerrado, a partir de dados técnicos e estudos científicos. Reforça que o desmatamento no Cerrado ganha dimensões ainda mais graves visto que a humanidade vive uma emergência climática, que pondera foi criada e se agrava por conta da emissão de CO2 na atmosfera, sendo o desmatamento do bioma Cerrado expressivo contribuinte neste sentido. Reforça-se a imprescindibilidade do Cerrado para o equilíbrio climático, segurança energética, garantia de produção pelo agronegócio.
Como narrativa jurídica, a inicial aponta as inconstitucionalidades que entende presentes nos atos normativos impugnados. Menciona a alteração da regra de publicidade dos autos de infração prevista no parágrafo único do art. 31 da Lei Estadual nº 18.102.13 (Lei de processo administrativo ambiental), violando os princípios da publicidade e da transparência. Pontua que o princípio da publicidade se encontra positivado na Lei do Processo Administrativo (Lei n° 9.784/1999) em seu artigo 2°, no artigo 5° a Lei de Licitações (Lei n° 14.133/2021), na Lei da Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/1992) e na Lei Federal n° 10.605/2003. No âmbito do Direito ambiental, o respeito à publicidade estaria resguardado pelo Decreto Federal n. º 6.514/2008 e pela Lei n. º 6.938/81 (artigo 4º, V).
Em seguimento, a inicial refere a Retirada do limite para despesas de administração de fundos prevista no §6o do art. 85-A da Lei no 18.102/13, §5o do art. 50 da Lei no 29.694/19 e aumento do limite no art. 5o da Lei 22.017/13. A legislação, segundo alega a inicial, deixa de prever um limite para a remuneração da instituição selecionada para gestão do fundo privado dos recursos provenientes da conversão de multas, de compensações florestais ou ambientais, abrindo margem para a destinação de qualquer quantia para a manutenção de determinado fundo. Este novo cenário impossibilita a verificação e a transparência acerca dos valores que são efetivamente destinados à manutenção do fundo e os que se destinam à atividade-fim do órgão. Ademais, pondera-se que a referida lacuna cria abertura de espaço para o gasto excessivo com manutenção dos fundos, prejudicando, por conseguinte, a proteção/recuperação ambiental, que deveria ser o fim precípuo do próprio fundo.
Reporta que no artigo 5° da Lei 22.017/2023 há uma previsão de limitação em 12% da remuneração com os recursos arrecadados para a promoção da gestão e despesas de administração, quando realizada em conjunto com outros órgãos reguladores, mas que referida limitação se mostra sem qualquer impacto efetivo no caso em concreto, haja vista que é quase o dobro do teto inicialmente previsto e apenas será aplicado quando houver administração conjunta dos órgãos.
A inicial segue argumentando que houve a criação de um sistema de Cadastro Ambiental Rural Autônomo pela alteração ao §2o do art. 3o da Lei 18.104/13, e que assim a legislação estadual entra em conflito direto com a Constituição Federal e o Código Florestal, ignorando o as regras estabelecidas no CAR Nacional. Argumenta-se que a alteração viola, portanto, a competência já exercida pela União de instituir um cadastro ambiental rural nacional a fim de conferir maior proteção ao meio ambiente, consoante dispõe o caput do art. 29 do Código Florestal. Refere que houve a desconsideração de áreas de Reserva Legal averbadas em matrícula de imóveis pelo §5o do art. 26 da Lei no 18.104/13, assim como a autorização de cômputo na área de Reserva Legal de área de murundus sem a vedação de conversão de novas áreas trazida no §6o do Art. 27 da Lei 18.104/13. Sustenta que houve a instituição de meios de compensação ambiental menos protetivos, possibilidade de o particular não realizar alteração da reserva legal original para recomposição da área total devida e vedação expressa da aplicação do §9o do art. 66 do Código Florestal, e que houve autorização para supressão de vegetação simplificada de maneira abusivamente permissiva pelo art. 50-A na Lei no 18.104/13 inserido pelo art. 2o da Lei 22.017/23.
A inicial refere, ainda, que houve ampliação abusiva do conceito de limpeza de área e área abandonada trazida pelos incisos XIII e XV do art. 3o da Lei 20.694/19 (Lei do Licenciamento Ambiental goiana) inserido pelo art. 3o da Lei 22.017/23, além da possibilidade de opção pelo particular da instância em que ocorrerá o licenciamento ambiental trazido pelo §3o do art. 11 da Lei no 20.694/19 inserido pelo art. 3o da Lei 22.017.23, em evidente violação da competência do município e da própria proteção ambiental. Pontua, em desfecho, que foram estabelecidos valores irrisórios de compensação ambiental por dano à fauna trazido pelo §3o do art. 32 da Lei 20.694/19 inserido pelo art. 3o da Lei 22.017/23.
Argumenta-se que há violação ao Regime de Competência Concorrente Estabelecida pelo artigo. 24, VI, §§ 1o e 2o e competência comum prevista no art. 23, VI e VII da CRFB/88, violação ao dever de proteção ao meio ambiente, promoção de retrocessos ambientais e, ao se facilitar o desmatamento, violação direta ao Acordo de Paris.
Como medida de tutela de urgência, requereu a inicial:
“a) A concessão da medida cautelar pleiteada a fim de que seja suspensa a eficácia dos seguintes dispositivos:
a.1) Lei Estadual no 22.017/23 Art. 1o, na parte que altera o parágrafo único do art. 31 e §6o do art. 85-A da Lei Estadual no 18.102/13; Art. 2o, na parte que altera o §2o do art. 3o, §5o do art. 26, §6o do art. 27, §2o do art.30o, p. único do art. 50-A da Lei Estadual no 18.104/13; Art. 3o, na parte que altera o art. 3o, XIII e XV, art. 8o, III e §3o do art. 11, §§ 3o e 4o do art. 32, §5o do art. 50 da Lei Estadual no 20.694/19 e art. 5o;
a.2) Lei Estadual no 18.104/13 Art. 30, §§3o e 4º
c) A oitiva da Assembleia Legislativa do Estado e do Governador do Estado Goiás, responsáveis pela edição das normas ora impugnadas, bem como do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, no prazo definido na Lei no 9.868, de 1999”
No mérito, a ação civil pública requer:
“… A confirmação da decisão cautelar concedida e, independentemente dela, que seja julgada totalmente procedente a presente ADI, a fim de declarar a inconstitucionalidade
dos seguintes dispositivos:
d.1) Lei Estadual no 22.017/23 Art. 1o, na parte que altera o parágrafo único do art. 31 e §6o do art. 85-A da Lei Estadual no 18.102/13; Art. 2o, na parte que altera o §2o do art. 3o, §5o do art. 26, §6o do art. 27, §2o do art. 30o, p. único do art. 50-A da Lei Estadual no 18.104/13; Art. 3o, na parte que altera o art. 3o, XIII e XV, art. 8o, III e §3o do art. 11, §§ 3o e 4o do art. 32, §5o do art. 50 da Lei Estadual no 20.694/19 e art. 5o;
d.2) Lei Estadual no 18.104/13 Art. 30, §§3o e 4o
e) A aplicação do rito abreviado (art. 12, da Lei no 9.868/99) para o processamento desta ADI; f) Em razão da relevância e da repercussão nacional da matéria, após a apreciação do pedido de medida cautelar e de colhida as informações, caso seja necessário, que sejam adotadas as providências do art. 9o, §1o, da Lei no 9.868/99;
g) As organizações ora signatárias requerem seja admitido o seu ingresso nos presentes autos na qualidade de amici curiae, inclusive para apresentar eventuais novas contribuições à cognição jurisdicional deste e. Supremo Tribunal Federal, incluindo-se a realização de sustentação oral”.
Decisão:
Em 11 de setembro de 2023 foi proferida decisão pelo Ministro Cristiano Zanin, sendo adotado o procedimento abreviado previsto no artigo 12 da Lei n. º 9.868/1999.