Resumo
Elaborado pela equipe do JusClima2030 em 1 de julho de 2025- Contexto da ação: A ação ministerial consubstanciada nesta Ação Civil Pública tem como diretriz o ensinamento do Supremo Tribunal Federal de que a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais ou econômicos, e que o princípio do desenvolvimento sustentável busca o equilíbrio entre economia e ecologia, subordinado à preservação do meio ambiente como um direito fundamental para as presentes e futuras gerações. Esta ação faz parte do Projeto “Amazônia Protege”, resultado de um esforço conjunto da 4ª Câmara do Ministério Público Federal. Seus objetivos incluem buscar a reparação do dano ambiental causado por desmatamentos na Amazônia, promover o compromisso público do MPF em ajuizar futuras ações, apresentar à sociedade uma ferramenta para identificação e controle de áreas desmatadas para evitar sua utilização econômica, e impedir a regularização fundiária de áreas ilegalmente desmatadas. Nesta fase do projeto, as ações são propostas contra responsáveis por polígonos iguais ou superiores a 60 hectares desmatados ilegalmente nos anos de 2020, 2021 e 2022. O projeto visa obter a tutela do Poder Judiciário para promover a responsabilização civil ambiental dos infratores, reduzindo a sensação de impunidade.
- Narrativa fática: Como narrativa fática, o Ministério Público Federal refere que esta ação civil pública tem por objeto a responsabilização pela reparação dos danos ocasionados pelo desmatamento ilícito de um total de 480,18 hectares perpetrado nos Municípios de Campo Novo de Rondônia e Nova Mamoré, detectados pelos sistemas oficiais e levado a cabo sem autorização do órgão ambiental estadual. O laudo pericial elaborado pelo MPF indica que não houve apresentação de qualquer documento autorizativo da supressão da floresta primária na região amazônica.
- Como prova da materialidade: Como prova da materialidade, o Ministério Público Federal indica que a mesma consiste em documentos relacionados à causa de pedir e perícia realizada pelo corpo técnico do Ministério Público Federal (laudo com código apgr00919719338). Esta perícia teve por objeto a delimitação de áreas desmatadas na Amazônia, com indicação dos possíveis responsáveis, em conformidade com o artigo 11 da Resolução 433/2021 do CNJ, que permite considerar provas produzidas por sensoriamento remoto ou obtidas por satélite em ações judiciais ambientais. A análise pericial confrontou imagens de satélite de áreas desmatadas com informações de órgãos oficiais para identificar desmatamentos ilegais de 60 hectares ou mais, vinculando os titulares das áreas. O MPF afirma que esta prova geoespacial é a mais robusta, oferecendo precisão cirúrgica na identificação e extensão da área desmatada, e está à disposição do réu para sua defesa. O MPF também menciona a NOTA TÉCNICA.02001.000483/2016-33 DBFLO/IBAMA como base para a quantificação do dano ambiental.
- Responsáveis e áreas/dados correspondentes:
- JOSE LUIZ ZAMPARONI: Responsável pelo desmatamento de 217,59 hectares segundo dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR).
- IVANILDA FRANCISCA DE SOUZA: Responsável pelo desmatamento de 173,63 hectares segundo dados do Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF).
- HELTON CARDOSO PIGNATARO: Responsável pelo desmatamento de 88,96 hectares segundo dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR).
- A responsabilidade é atribuída à parte que se sobrepõe diretamente ao cadastro público do réu na área desmatada, mesmo que o desmatamento total seja maior.
- Como narrativa jurídica: O Ministério Público Federal fundamenta a ação na responsabilidade objetiva por dano ambiental, que independe de prova de dolo ou culpa, configurando-se pela relação de causalidade com o dano, ou seja, a relação do titular da área (possuidor ou proprietário) com a coisa. A obrigação de reparação ambiental possui natureza propter rem, vinculada à propriedade, e se transmite aos sucessores. O conceito de “poluidor” é amplo e inclui quem direta ou indiretamente contribui para o dano. A obrigação é indivisível e, havendo múltiplos devedores, todos respondem solidariamente pela reparação. O MPF ressalta que a indenização por dano ambiental deve contemplar a reparação in natura e a indenização pecuniária por danos materiais e morais.
As bases jurídicas incluem:
- Constituição Federal (CF/88): Art. 225, §3º (fundamento para responsabilização por danos ambientais, independente de sanções penais/administrativas); Art. 1º, I e IV, e 5º (Ação Civil Pública); Art. 170, VI (defesa do meio ambiente); Art. 5º, §1º e §2º (aplicação imediata de direitos fundamentais, tratados internacionais); Art. 225, §4º (Floresta Amazônica como patrimônio nacional); Art. 127 e 129, III (funções institucionais do MPF); Art. 109, I (competência da Justiça Federal por interesse da União).
- Leis Específicas:
- Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública): Art. 1º, I e IV, e 5º (instrumentalização da ACP); Art. 18 (dispensa de custas do MPF); Art. 19 (inversão do ônus da prova).
- Lei nº 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente): Art. 3º, IV (definição de poluidor); Art. 14, §1º (responsabilidade objetiva, legitimidade do MPF para propor a ação).
- Lei nº 12.651/2012 (Novo Código Florestal): Art. 26 (exigência de CAR e autorização prévia para supressão de vegetação nativa).
- Lei nº 8.884/94: Modificou a Lei nº 7.347/85 para incluir a reparação por dano moral.
- Lei Complementar nº 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União): Corrobora a legitimidade do MPF.
- Código Civil (Lei 10.406/2002): Art. 258 e 259 (indivisibilidade da obrigação), Art. 942 e 275 (solidariedade obrigacional e responsabilidade dos coautores).
- Resoluções/Portarias/Notas Técnicas:
- Resolução 433/2021 do CNJ: Art. 11 (admissibilidade de provas por sensoriamento remoto/satélite); Art. 16 (suspensão liminar de cadastros ambientais rurais).
- Portaria MMA nº 43/2014 (Pró-Espécies): Instituiu o Programa Nacional de Conservação das Espécies Ameaçadas de Extinção.
- Portarias MMA nº 443/2014 (Flora Ameaçada), 444/2014 (Fauna Ameaçada), 445/2014 (Peixes e Invertebrados Aquáticos Ameaçados).
- NOTA TÉCNICA.02001.000483/2016-33 DBFLO/IBAMA: Utilizada para valoração do dano ambiental, com custo de R$ 10.742,00 por hectare na Amazônia Legal para recuperação.
- Protocolo para Julgamento de Ações Ambientais do CNJ (ato normativo 0005977-94.2023.2.00.0000): Utilizado para cálculo de indenização por emissão de CO2.
- Princípios: Princípio do Desenvolvimento Sustentável, Poluidor-Pagador, Precaução, In Dubio Pro Natura, Boa-fé e Cooperação Processual.
- Jurisprudência: A petição cita julgados do STF (ADI-MC nº 3540/DF), do STJ (REsp 1.905.367/DF, AgRg no AREsp 183202 / SP, REsp 1.090.968/SP, REsp 440002/SE, REsp 1057878/RS, CC 147.835 – PR, CC 145.875/MG, CC 129.493/RJ, CC 37.137/MG) e do TRF3 (APELAÇÃO CÍVEL – 1969405) e TRF2 (APELAÇÃO CIVEL – 526751), que consolidam a responsabilidade objetiva e propter rem, a solidariedade, a inversão do ônus da prova e a competência da Justiça Federal em matéria ambiental, especialmente quando há interesse da União ou espécies ameaçadas.
- Tratados Internacionais: O Brasil, como signatário do Acordo de Paris, comprometeu-se a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia. A ação também se baseia em diversas convenções internacionais sobre proteção da flora e fauna selvagens e diversidade biológica, como CITES e CDB, que consolidam o interesse federal e transnacional na proteção de espécies ameaçadas.
- Em sede de tutela provisória: O Ministério Público Federal requer a suspensão liminar dos cadastros ambientais rurais (CAR) dos demandados, para que o acesso a crédito bancário seja bloqueado, nos termos do artigo 16 da Resolução 433 do Conselho Nacional de Justiça. Além disso, requer a inversão do ônus da prova ab initio, considerando a prova pericial pré-constituída apresentada pelo MPF, para que os demandados tenham a oportunidade de provar a inexistência do dano e a não utilização da área desmatada. O MPF também solicita a não realização de audiência conciliatória, pois as propostas de conciliação estarão disponíveis na página eletrônica do MPF.
- Em definitivo: O Ministério Público Federal requer que a ação civil pública seja julgada procedente, condenando os requeridos:
- (i) Em obrigação de pagar quantia certa, correspondente ao dano material derivado do desmatamento:
- JOSE LUIZ ZAMPARONI: R$ 2.337.351,78.
- IVANILDA FRANCISCA DE SOUZA: R$ 1.865.133,46.
- HELTON CARDOSO PIGNATARO: R$ 955.608,32.
- (ii) Em obrigação de pagar quantia certa, correspondente à indenização pela emissão de CO2 na atmosfera, aplicando-se o protocolo para julgamento de ações ambientais do Conselho Nacional de Justiça:
- JOSE LUIZ ZAMPARONI: R$ 2.337.336,56.
- IVANILDA FRANCISCA DE SOUZA: R$ 1.865.082,22.
- HELTON CARDOSO PIGNATARO: R$ 955.580,33.
- (iii) Em obrigação de pagar quantia certa, correspondente ao dano moral difuso:
- JOSE LUIZ ZAMPARONI: R$ 1.168.675,89.
- IVANILDA FRANCISCA DE SOUZA: R$ 932.566,73.
- HELTON CARDOSO PIGNATARO: R$ 477.804,16.
- (iv) Em obrigação de fazer, consistente em recompor a área degradada mediante sua não utilização para propiciar a regeneração natural, bem como apresentação de Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) perante a autoridade administrativa competente, nas seguintes proporções:
- JOSE LUIZ ZAMPARONI: na área de 217,59 hectares.
- IVANILDA FRANCISCA DE SOUZA: na área de 173,63 hectares.
- HELTON CARDOSO PIGNATARO: na área de 88,96 hectares.
- A dispensa do MPF do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, com base no artigo 18 da Lei nº 7.347/85.
- A reversão dos valores da condenação para os órgãos de fiscalização federal (IBAMA e ICMBIO) com atuação no estado, com suporte no princípio da máxima efetividade na proteção ambiental.
- A autorização para todo órgão de controle e fiscalização realizar a imediata apreensão, retirada e destruição de qualquer bem móvel ou imóvel existente na área que impeça a regeneração natural da floresta ilegalmente desmatada.
- A juntada à presente ação de qualquer nova informação encontrada sobre pessoas que praticaram o dano ou que estejam realizando atividade econômica/exploração da área para figurarem como réus.
- A declaração da área total desmatada ilegalmente como patrimônio público, com autorização para que as autoridades administrativas efetuem a retomada da área e a respectiva apreensão e/ou destruição do que estiver impedindo a regeneração natural da floresta, exceto para propriedades menores que 4 módulos fiscais.
- (i) Em obrigação de pagar quantia certa, correspondente ao dano material derivado do desmatamento:
- Peças anexadas com a inicial: O Ministério Público Federal menciona ter anexado à petição inicial:
- Perícia realizada pelo corpo técnico do Ministério Público Federal (laudo com código apgr00919719338).
NOTA TÉCNICA.02001.000483/2016-33 DBFLO/IBAMA, sobre custos de recuperação de área degradada, que fundamenta o cálculo do dano material.