Resumo
Elaborado pela equipe do JusClima2030 em 19 de October de 2024Petição Inicial
O INSTITUTO INTERNACIONAL ARAYARA DE EDUCAÇÃO E CULTURA e o INSTITUTO ARAYARA DE EDUCAÇÃO PARA A SUSTENTABILIDADE ingressou em julho de 2024 com ação civil pública, indicando como réu o Estado do Rio Grande do Sul, visando garantir que o estado implemente um plano efetivo de transição energética justa, com foco no descomissionamento do setor termoelétrico movido a combustíveis fósseis, dada a urgência da crise climática e os impactos ambientais negativos causados por essas usinas, especialmente as localizadas em Candiota/RS.
Como narrativa fática, a inicial argumenta que a crise climática é uma realidade inescapável e que o Estado do Rio Grande do Sul já está enfrentando consequências catastróficas, como enchentes e outras calamidades relacionadas ao clima. Destaca que o setor termoelétrico do Rio Grande do Sul, especialmente as usinas de Candiota III e Pampa Sul, são extremamente ineficientes e grandes responsáveis por emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Sumariza elementos científicos apresentados pelo Relatório Síntese do IPCC no sexto ciclo de avaliação (AR6), pontuando que a publicação indica o consenso científico sobre a influência antrópica nas mudanças climáticas observadas, com ameaças ao bem-estar humano, às sociedades e à Natureza. O Relatório do IPCC indica, consoante a inicial, a responsabilidade da persistência na queima de combustíveis fósseis para o agravamento das mudanças climáticas. Os principais riscos afetos pelo agravamento das mudanças climáticas na América do Sul são pormenorizados pela inicial, sendo referidos eventos climáticos extremos recentemente ocorridos no Estado do Rio Grande do Sul (ciclone e estiagens severas).
Especificamente quanto ao município de Candiota, a peça inicial reporta a assinatura do Decreto municipal número 4.595/2023, com a determinação de racionamento de água potável na localidade. Concomitantemente, refere que os recursos hídricos daquela região são utilizados de modo intenso pelas termelétricas movidas a carvão em atividade, em detrimento do abastecimento à população local.
Argumenta que os entes públicos indicados na inicial não estão tomando as medidas necessárias para cumprimento das normas vigentes em matéria de mudanças climáticas (a exemplo da PNMC e da PGMC), ilustrando com a persistência na manutenção da matriz energética baseada em combustíveis fósseis, notadamente o carvão mineral no contexto do Rio Grande do Sul. Ponderam os autores que os réus indicados igualmente estariam negligenciando a avaliação sobre o componente climático, assim como o regime jurídico incidente em matéria de mudanças climáticas, por ocasião de licenciamentos e de renovação de licenças a atividades intensivas em emissões no Estado do Rio Grande do Sul. Reforçam a conexão causal entre a opção pelo prosseguimento da exploração de matriz fóssil e o descumprimento de compromissos normativos assumidos em matéria de enfrentamento às mudanças climáticas, tais como o Acordo de Paris e a legislação federal e estadual correlatas.
A inicial narra que o Ibama e a Fepam persistiriam realizando licenciamento de empreendimentos sem considerarem o componente climático em suas avaliações, e que a Aneel seguiria realizando leilões de energia direcionados às usinas termelétricas. A CRM, segundo os autores, estaria operando as usinas em desrespeito à legislação vigente, e a CTG Eletrosul, ao persistir no funcionamento de usina excessivamente emissora, igualmente estaria descumprindo os princípios e diretrizes que juridicamente regem o tema.
O Estado do Rio Grande do Sul, por sua vez, teria tardiamente implementado o Fórum Gaúcho sobre Mudanças Climáticas, carecendo o mesmo, quando finalmente implementado, da devida representativa dos integrantes da sociedade civil gaúcha. O Estado igualmente não teria ainda implementado avaliações ambientais estratégicas devidas sobre o tema. Reforçam os autores a necessidade de readequação da composição do Fórum Gaúcho de Mudanças Climáticas, destacando a ausência de transparência dos atos do Fórum, a insuficiente participação nos processos de licenciamentos ambientais de empreendimentos emissores de gases de efeito estufa.
Refere que o programa estadual Proclima 2050 é inadequado e insuficiente para atender às necessidades do estado em termos de transição energética e mitigação das mudanças climáticas. Pondera não remanescerem dúvidas de que existe uma grande contribuição do setor termoelétrico movido a combustíveis fósseis do estado do Rio Grande do Sul para as mudanças climáticas e uma clara necessidade de que o estado promova medidas ativas e efetivas para a efetivação de uma transição energética justa no estado do Rio Grande do Sul.
A petição reforça a necessidade de ações urgentes devido à emergência climática, que exige uma transição energética justa para reduzir as emissões de GEE e evitar futuras catástrofes.
Como narrativa jurídica, a inicial reforça a legitimidade do autor para o ajuizamento da demanda. Refere que o Acordo de Paris traz o objetivo de manutenção da temperatura da superfície bem abaixo de 2º C, e que o Acordo contempla a responsabilidade dos signatários em efetivamente promoverem medidas ativas no sentido de reduzirem suas emissões de gases de efeito estufa. Argumenta que no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul as medidas adotadas (e exemplifica com o Programa Proclima 2050) são claramente insuficientes aos objetivos de mitigação de emissões.
Sustenta o autor que o ordenamento jurídico brasileiro tutela a proteção do sistema climático no artigo 225 da Constituição Federal de 1988, e que o país internalizou a Convenção-Quadro das Nações Unidas, o Protocolo de Quioto e o Acordo de Paris. A Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, em seu artigo 251, igualmente segundo a parte autora tutela o meio ambiente equilibrado, e o estímulo para adoção de fontes renováveis de energia.
Menciona a inicial, ainda, a previsão nos artigos 170, VI e 225 da CF1988, e a exigência de compatibilização entre as atividades econômicas e a preservação do meio ambiente.
Como medida de tutela de urgência, requereu a inicial:
a) Que o Estado do Rio Grande do Sul seja compelido a instaurar um comitê participativo no prazo máximo de trinta dias para elaboração do plano de transição energética justa, com a participação do Estado do Rio Grande do Sul, prefeitura do Município de Candiota, ao menos 2 entidades da sociedade civil que atuem na área de transição energética, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Ministério Público Estadual, no prazo máximo de 30 dias;
b) Que o comitê participativo conduza seus trabalhos e propostas com base em dados respaldados por conhecimento científico, inclusive com a contratação de consultoria especializada para auxiliar em seu funcionamento;
c) Que após a instauração, o comitê apresente o plano de transição energética justa para o Estado do Rio Grande do Sul, com medidas efetivas para o descomissionamento do setor termoelétrico movido a combustíveis fósseis do estado em curto espaço de tempo, no prazo máximo de 180 dias;
d) Que o Estado do Rio Grande do Sul seja impedido de realizar a desoneração, conceder incentivos, novos licenciamentos e até mesmo obras de reconstrução de infraestrutura para o setor termoelétrico movido a combustíveis fósseis do estado.
No mérito, a ação civil pública requer:
Ao final do processo, que seja a presente Ação Civil Pública julgada TOTALMENTE PROCEDENTE a fim de, confirmando a liminar deferida:
h.1) Condenar o Estado do Rio Grande do Sul seja a instaurar um comitê participativo para elaboração do plano de transição energética justa, com a participação do Estado do Rio Grande do Sul, prefeitura do Município de Candiota, ao menos 2 entidades da sociedade civil que atuam na área de transição energética, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Ministério
Público Estadual, no prazo máximo de 30 dias;
h.2) Condenar o Estado do Rio Grande do Sul a contratar consultoria especializada para auxiliar o comitê com o levantamento de dados e informações e elaboração de proposta base;
h.3) Condenar o Estado do Rio Grande do Sul a apresentar o plano de transição energética justa para o Estado, elaborado pelo comitê participativo, com medidas efetivas para o descomissionamento do setor termoelétrico movido a combustíveis fósseis do estado em curto espaço de tempo, no prazo máximo de 180 dias;
h.4) Condenar o Estado do Rio Grande do Sul a não realizar a desoneração, conceder incentivos, novos licenciamentos e até mesmo obras de reconstrução de infraestrutura para o setor termoelétrico movido a combustíveis fósseis do estado; Foi requerida a inversão do ônus da prova.